sábado, 8 de dezembro de 2007

Fronteiras do pensamento, da paciência e da beleza

Tirei a roupa de ginática e botei o que estava vestindo antes. Corri para a Reitoria. Aliás, corri para pegar o ônibus para ir à Reitoria. A academia ainda não fez milagre no meu condicionamento físico.

Quando cheguei lá, me meti na primeira fila absurdamente grande para arranjar a pulseirinha VIP que o meu professor havia me prometido.

Oi. Tu é a Michele? Eu sou aluna do Hohlfeldt. (estendendo o pulso)



Esta era a senha to the doors of perception (como diria Jim Morrison). As portas para entender o que o escritor (e tantas outras atividades mais) Michel Houellebecq pensa, teoriza e bota no papel. Quando eu já avistava as lindas moças do outro lado do balcão, uma delas veio em nossa direção (nós meaning simples terrestres que não têm a pele perfeita ou o cabelo Seda Brilho Gloss - o comercial com a frase 'Ou você tem brilho ou não tem nada' ecoou pelo meu cérebro).

-Todo mundo que está nessa fila está querendo comprar o passaporte para o ano que vêm, né?!

Não. Eu só quero aproveitar todas as regalias de bolsista da PUC e de aluna do professor Hohlfeldt. Eu não quero pagar 550 reais, mesmo que eu possa parcelar em INCRÍVEIS DUAS vezes. Saí humildemente do meu lugar e fui falar com a moça.

Ela não sabia aonde eu tinha que ir. 'Essa fila é para os alunos que querem comprar o passaporte." Ok, isso eu já entendi. Falei com alguém do balcão, que me apontou a Michele. A Michele era a chefona. Tão chefona que nem a sua voz de taquara rachada nem o seu sorriso branco e largo a impedia de ser contaminda pelo estresse.

Ela me disse alguma coisa sobre 19 e trinta, 20 e trinta, lançamento do Fronteiras 2008, palestra. E A MINHA PULSEIRINHA?! ela já tinha voltado ao mar de pessoas empiriquitadas que tinham coragem de se mostrar indignados pela falta de informação. Coisa que eu não tinha.

Esperei perto de um pilar a Michele passar de novo por mim. Mas ela era agarrada por unhas bem feitas e puxada por mãos de anéis enormes. Todas já impacientes. Enquanto isso, aproveitei pra ver o trabalho das moças de-pele-perfeita-e-cabelo-Seda-Brilho-Gloss. As loiras do balcão avisavam as pessoas que elas precisavam entrar na fila grande, para depois voltarem ali. A Michele gritava (lembre-se: com sua voz de taquara rachada) que não era necessário entrar na tal fila. E o movimento bate-e-volta de 'fila-balcão livre-fila' continuava. Também havia umas outras loiras e uma morena que tinham que estar amenizando o caos, tirando dúvidas sobre pagamentos e prazos. Mas elas não sabiam as respostas. Então ficavam atrás da chefona perguntando o que elas já deveriam saber.

Quando consegui abordar a Michele de novo, ela repetiu furiosa (lembre-se: com a voz de taquara rachada): às 19 e trinta vai ter o lançamento do Fronteiras do Pensamente 2008! Às 20 e trinta começa a palestra!

E A MINHA PULSEIRINHA?!

Voz de taquara rachada: Tu pega às oito e meia!

Ahhhh tá. Perguntei pra uma outra loira de-pele-perfeita-e-cabelo-Seda-Brlho-Gloss se os mortais também poderiam ir no lançamento. O seu sorriso branco disse que sim. Quando eu cheguei no salão, vi que nem o efeito (de) estufa daquele lugar (calor insuportááááável) amainava o momento Eu Tenho Grana e Sou Culto da nata porto-alegrense. Vestidos, colares, ternos(!) estavam lá, lado a lado com a minha mochila azul (rasgada na alça e perto do fecho). Depois de 'o que eu estou fazendo aqui?' passar pela minha cabeça, vi uma mão acenando na minha direção. Era um amigo, o Gustavo. De calça jeans, tênis e camiseta, para minha sorte.

Ficamos nós dois num canto. Olhando para o teto de vez em quando para descobrir de onde poderia sair um jato frio de ar-condicionado. Enquanto isso, garçons musculosos passavam na nossa frente. O nível daquele ambiente era à la damasco com ameixa seca. Também tinha champagne. E vinho. E amêndoas e amendoins em saquinhos. Num certo momento, apareceu uma bandeija com castanhas de caju. Na outra mão do homem, havia várias casquinhas de sorvete. E CADÊ O SORVETE?! Mas isso quem disse foi o Gustavo. Pelo menos eu não era a única a pensar isso. Mais tarde ainda vimos morangos mergulhados no gelo. A vontade de deixar o morango e pegar o gelo era grande.

Não sei se foi antes ou depois do vídeo com a apresentação dos novos conferencistas. Só lembro de algumas pessoas caminharem ao lado de Michel Houellebecq. Com um cabelo meio desgrenhado, uma camisa amarelo-ovo, um blazer bege e uma calça aparentemente cargo, ele assassinava a moda. Mas era a estrela. A princípio, o motivo para todos estarem ali. Porém ninguém deu muita bola para a sua presença. Ou eles estão muito acostumados a celebridades, ou raríssimos sabiam quem era Michel Houellebecq.






Tô mais pra segunda opção.

12 comentários:

Carolina Tavaniello P. de Morais disse...

Segunda opção. Nem todo mundo é culto e tem aula com o Juremir para saber quem é Michel Houellebecq, Liza. Hehe

Unknown disse...

é, acho que só o tio jurema sabe quem é o cara.
afinal... tu conseguiu a pulseirinha? heuheueheuheuhe

Liza Mello disse...

ah pára! se tu tá indo lá ver o cara falar, tu tem q no mínimo reconhecer ele!

a michele estava tão atarefada que nem pulserinha me deu, john! ela me mandou entrar direto...

Anônimo disse...

1) eu não sei quem é;
2) me diz por mail como se compra o passaporte pro ano que vem e como dá pra parcelar;
3) voltaste com força total, hein: Fez um textão!!!! ;-)

Liza Mello disse...

pessoal! eu não acho o Ó não saber quem é Michel Houellebecq! eu acho o Ó pagar e ir até lá assistir a um cara q tu não se sabe quem é!

ah sim.. me emocionei! escrevi horrores!

bah, eu não sei de muita coisa... só sei q dá pra comprar pela internet! vê no site do Fronteiras:
www.fronteirasdopensamento.com.br

Luana Duarte Fuentefria disse...

Liza, tu tá definitivamente virando o Juremas...

Vou começar a procurar no google a cara de todos os escritores, e etc, que gosto. hehe

Anônimo disse...

Liza, muito legal que nós pensamos praticamente da mesma forma sobre toda esta noite cheia de estranhezas, como casquinhas sem sorvetes. aliás, eu pensei na casquinha sem sorvete como uma boa metáfora ao público que nós ficamos, num canto, analizando e que tu descreveu tão bem. acho que eles eram do tipo casquinhas sem sorvete.

mimi aragón disse...

salve, liza! vim retribuir a visita. pelo jeito, o talento pra contar histórias tá no sangue dos marques, ahn? que belê! voltarei.

Liza Mello disse...

bah, gustavo! a metáfora de que eles eram casquinhas sem sorvetes é mto boa! eu não tinha pensado nisso!

mimi! obrigada pela visita! e pelos elogios! hehe tb voltarei no Dois Legumes

Samir Oliveira disse...

Não consigo imaginar a Michele estressada!! mas consigo imaginar, até com certo prazer, a nata rica e supostamente culta de Porto Alegre tendo que forjar sorrisos gelados num calor insuportável :)

ótimo texto!

Ananda Etges disse...

teu texto me fez lembrar eu e o wagner rindo da "nata" no fronteira da autora do livreiro de cabul. todos com seus narizes empinados e suas risadas irritantes são fora do sério!
ótimo texto, liza!

Iamni Reche disse...

hahahha
Já senti isso antes.
Esse ano a Zelia Duncan fez show no Embratel Convation Center (um lugar de shows aqui em Curitiba que costuma ser bem careiro). Enfim, eu e minha amiga fomos direto da escola pro show, então estavamos de jeans, camiseta, all star e mochila. Quando a gente chegou lá, só tinha gente vestida de gala. No começo ficamos com vergonha... depois de um tempo, a minha amiga apontou pra um cartaz pendurado atras da gente. Quando eu olhei, era uma foto enorme da Zelia Duncan de... All Star! A gente riu e curtiu o show, que foi maravilhoso :D

Feliz Natal mente pensante ;D